Data de publicação: 31/01/2013
Por Vinicius Zepeda
O uso de recursos tecnológicos e de entretenimento também pode ser um enorme aliado para motivar jovens nos estudos, principalmente aqueles que vivem em áreas mais pobres, como favelas da região metropolitana do Rio – onde o índice de evasão escolar é maior. O projeto Difusão e popularização da ciência e tecnologia através de mídias digitais contextualizadas para a inclusão sócio-produtiva de adolescentes pobres da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, coordenado pela professora Gilda Helena Bernardino de Campos, da Coordenação Central de Educação à Distância (CCEAD), da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), criou, há cerca de dois anos, uma série de programas de rádio que abordam temas na área de ciência e tecnologia, comuns ao cotidiano destes jovens, como a questão do lixo urbano, poluição atmosférica, alimentos mais saudáveis, reciclagem de embalagens e conservação de alimentos, entre outros. Reunido em uma rede social na internet, voltada para uso exclusivo de professores, esse material vem sendo disponibilizado nos telefones celulares de adolescentes que fazem parte dos Cursos Comunitários Pré-Técnicos (CCPTs). Aulas preparatórias gratuitas para escolas técnicas e profissionalizantes, esses cursos em geral são ministrados por professores voluntários, em espaços cedidos por instituições religiosas ou associações de moradores das comunidades. A iniciativa conta com auxílio da FAPERJ através do edital Apoio à Difusão e Popularização da Ciência no Estado do Rio de Janeiro.
Gilda ressalta que, como esses cursos acontecem aos finais de semana, é extremamente importante usar metodologias de ensino que motivem os alunos a participar. “Na CCEAD, já disponibilizamos vídeos e matérias voltados para a temática de C&T, mas ainda não tínhamos desenvolvido um modo de torná-los mais atraentes para difundi-los em espaços comunitários”, explica. Foi então que, em conjunto com o professor José Carmelo, do Departamento de Educação da PUC, conhecido por sua experiência com CCPTs, e com a pedagoga Cileia Fioroti, da mesma universidade e que também já vem trabalhando com classes comunitárias, ao lado de Carmelo, o projeto foi elaborado. “Cileia passou a me ajudar fazendo contato com as equipes nas favelas”, acrescenta.
Batizado de Almanaque Sonoro de C&T, o site, que funciona como uma rede social de acesso exclusivo para professores, foi elaborado pelo designer do CCEAD Claudio Perpétuo. Ali estão disponibilizados os programas de rádio, com cinco minutos de duração cada,que são apresentados nos CCPTs das favelas de Vila Kennedy e Sulacap, Zona Oeste do Rio, e na favela Perfeita Alegria, em Nilópolis, município da Baixada Fluminense. Na universidade, Gilda prepara os professores voluntários que aplicarão o método nas comunidades. Durante as aulas, o site é exibido e um dos programas é apresentado para que os alunos possam ouvir e debater. O arquivo do programa também é disponibilizado nos celulares dos alunos para que, durante a semana eles possam escutar outras vezes seu conteúdo. “Na semana seguinte, debatemos o assunto e propormos trabalhos em grupo, em geral, fazendo com que eles produzam pequenos vídeos sobre o que escutaram. O material produzido por cada turma é disponibilizado na internet para que os professores dos CCPTs possam discutir e trocar informações”, explica Gilda. “No site, que funciona como uma rede social, ainda há espaço para blogs, material disponível para professores, além de fotos, notícias sobre eventos e chats para professores”, acrescenta.
Os resultados obtidos até o momento têm sido bastante promissores e vão além dos vídeos propostos no projeto. No caso da Vila Kenedy, por exemplo, onde as aulas acontecem em uma igreja próxima a um valão, uma das primeiras questões trabalhadas numa turma de 35 alunos foi a do lixo urbano. “Com maior consciência sobre o problema, eles começaram a fiscalizar e orientar os moradores a não jogar mais lixo no local, conseguindo parar de poluir aquele trecho”, recorda Gilda. Ela acrescenta ainda que um dos objetivos do projeto é formar multiplicadores entre os professores e replicar a metodologia do Almanaque na rede pública estadual. Na Vila Kenedy, isso já está ocorrendo. Um dos professores voluntários, que também dá aulas de português num Centro Integrado de Educação Pública (Ciep), no bairro de Santíssimo, Zona Oeste, está reproduzindo um dos programas – o que fala sobre alimentação saudável e problemas, como obesidade e doenças cardíacas, que vem afetando cada vez mais as crianças – na escola. “A partir do texto impresso do programa, os alunos desenvolveram, durante todo o semestre, uma peça de teatro. Com isso, puderam treinar não só a criatividade, como práticas de escutar, acompanhar a leitura e técnicas de oralidade, como noções de respiração, entonação e projeção de voz, para poder encená-la “, complementa.
Em Nilópolis, numa turma de 17 alunos, os jovens se divertiram com os programas, criaram cartazes e fizeram apresentações em powerpoint com o material disponibilizado. “Por conta própria, eles criaram uma página no Facebook, disponibilizando o que haviam aprendido. Também descobriram no site da CCEAD alguns vídeos e disponibilizaram o áudio na rádio comunitária, passando a realizar pequenas competições de conhecimentos entre eles”, afirma Gilda.
Mas foi em Sulacap, bairro da Zona Oeste do Rio, onde os jovens de uma turma de 25 alunos se mostraram mais interessados e organizados. Até uma ong foi criada pelos professores voluntários e alunos para realizar atividades e dar continuidade ao projeto: o Instituo do Bem (IBB). “Pelo IBB, eles passaram ouvir o material fora de aula e resolveram criar a página Ciência on-line, divulgando uma maratona de conhecimentos sobre temas como lixo urbano, combustíveis, embalagens e química na atmosfera”, explica Gilda. Ela comemora um resultado ainda mais importante: “Ali, eles conseguiram uma redução de 50% na evasão escolar, em relação ao ano anterior”, destaca.
Segundo Gilda, um dos pontos mais importantes dos CCPTs é complementar os estudos desses jovens. Segundo dados do Ministério da Educação, apenas 2% dos jovens moradores de favelas da região metropolitana do Rio têm acesso ao ensino médio (antigo segundo grau). “Metade dos que concluem o ensino fundamental domina apenas conteúdos curriculares de matemática e português correspondentes apenas ao quarto ano. Nosso projeto tem funcionado como um grande aliado para facilitar o ensino de ciência entre este jovens e contribuir para a diminuição da evasão escolar”, conclui.
Fonte: http://www.faperj.br/boletim_interna.phtml?obj_id=8813