O presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia 6ª Região Minas Gerais e Espírito Santo (CRB-6), Álamo Chaves (CRB-6/2790), teve artigo publicado pelo jornal e portal de notícias O Tempo sobre o tema “A polêmica dos livros religiosos em bibliotecas”.
Confira na íntegra:
A polêmica dos livros religiosos em bibliotecas
Álamo Chaves
Presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia 6ª Região de Minas Gerais e Espírito Santo (CRB-6)
Os brasileiros foram pegos de surpresa com o projeto de um deputado sobre, mais uma vez, a “inclusão de bíblias em acervos de instituições públicas de ensino”, tramitando na Câmara dos Deputados. O Projeto de Lei 4.242/2021 obriga a inclusão de, no mínimo, dois exemplares da Bíblia em bibliotecas de instituições públicas no ensino básico e superior. A justificativa do deputado Milton Vieira (Republicanos-SP) é a “importância cultural” desse conteúdo na aprendizagem dos jovens.
O assunto virou polêmica novamente, após, em 2010, a Assembleia Legislativa do Amazonas promulgar a Lei 74/2010, obrigando as escolas e bibliotecas públicas a disponibilizarem ao menos um exemplar da bíblia em seu acervo.
Cinco anos depois, o então procurador geral da República Rodrigo Janot identificou no texto aprovado pelos deputados estaduais uma ofensa ao princípio do Estado Laico e à liberdade religiosa, entrando com ação para derrubar a lei amazonense.
Somente em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou o pedido de Janot, declarando a lei como inconstitucional.
Aparentemente, o que o deputado e a bancada religiosa parecem ignorar é que, quando é citada a “importância cultural” da existência de Bíblias nas instituições, não se fala sobre o investimento em obras essenciais da literatura – não só brasileiras, como também mundiais. Esses livros poderiam agregar ainda mais conhecimento e contribuir nos processos de ensino.
O investimento do governo e das prefeituras em Bíblias pode ser revertido em prol do atendimento de critérios técnicos, aplicados por profissionais bibliotecários, para disseminar cultura para todos e para melhorar a educação. Parte do dinheiro dos impostos pagos não está sendo investido na aquisição de obras clássicas da literatura, em hemeroteca de qualidade e, principalmente, para aproveitar a gratuidade da internet para os usuários, já que muitas bibliotecas de instituições escolares se encontram em situação de absoluto abandono.
A situação é polêmica e bastante preocupante, sendo muito prejudicial, especialmente, caso ocorra a validação do projeto de lei pelo Legislativo. Se o objetivo dos parlamentares fosse difundir ou disseminar o ensino e a história das religiões, a proposta deveria contemplar, também, obviamente, os livros de outras religiões para que os jovens tenham total liberdade para exercer as próprias escolhas, já que o Brasil é um país secular, desde 1890, ou seja, uma nação imparcial em relação às questões religiosas, não podendo apoiar nem se opor a quaisquer religiões. Por enquanto, é melhor ficar de olho e aguardar a análise da proposta, em caráter conclusivo, pelas comissões de Educação e também pela de Constituição e Justiça e de Cidadania.