Luis Junqueira relata histórias de adolescentes da Fundação Casa que estão deixando a criatividade fluir no papel
A proposta do Primeiro Livro para os alunos é simples: você tem um ano letivo para escrever um livro. Nós adultos te daremos tempo e apoio cultural na sua jornada. De 2009 para cá, foram mais de 300 alunos da Escola Castanheiras que toparam a ideia e publicaram seus livros e, neste ano, são 300 alunos de escolas públicas que bancaram o desafio, em dois centros da Fundação Casa (locais onde adolescentes infratores cumprem medidas socioeducativas de internação) e em cinco escolas municipais em São Paulo e Alagoas.
Vou escrever sobre três alunos na Fundação Casa:
Pela primeira vez neste ano temos um pai escrevendo uma obra no projeto Primeiro Livro. Não sabia disto até semana passada, quando li em sua dedicatória uma sensível homenagem ao seu filho de dois anos: “Foi por ele que decidi fazer este livro”, escreve. O aluno, pai, 19 anos, conta em seu livro infantil a história de uma reconciliação familiar.
Pela primeira vez também, temos um aluno diagnosticado com transtorno de personalidade antissocial, um obstáculo emocional que mistura falta de reconhecimento das emoções e incapacidade de se colocar no lugar de outra pessoa. No livro ele se coloca no lugar de Maria, sua heroína, que teve câncer no cérebro, ficou em coma, acordou, caiu no mundo das drogas e, mesmo assim, conseguiu se recuperar e seguir sua missão de vida na medicina. “Eu escrevo este livro para que as pessoas pensem que existe um jeito de mudar nessa vida, como Maria mudou, eu creio que vocês também podem mudar.”
Em sua oitava (!) passagem pela Fundação Casa, outro aluno escreveu em sua sinopse “refletir também sobre o outro não é uma coisa fácil, pois, para fazer isso, precisamos ter sabedoria e humildade para perceber o outro e, com isso, perceber a nós mesmos”. Publicará, ao fim deste ano, um livro de autoajuda.
Estes jovens tiveram tempo e suporte para deixar a criatividade fluir no papel.
Fazemos um projeto que leva a sério a dimensão prática da aprendizagem. A escrita de um livro pressupõe realmente muitas palavras escritas, deletadas e reescritas. E neste enquanto a gente reflete sobre a vida e faz educação.
Torço muito para que estas palavras escritas durante o ano – estas reconciliações familiares, estas mudanças e percepções do outro – se tornem ações de fato.
Primeiro Livro no Catarse
Pensando em estimular ainda mais a continuidade dos trabalhos dos alunos e expandir a aplicação do projeto por diversas regiões do país, o Primeiro Livro está com uma campanha no Catarse, plataforma de financiamento coletivo, até o dia 4 de novembro. A ideia é conseguir arrecadar verba para publicar 25 cópias de cada livro de cada aluno, e presentear esses jovens autores das instituições públicas no fim do ano.
* A experiência do Primeiro Livro na Fundação Casa é apresentada hoje no Implemento , programa realizado pela Hackademia em parceria com o Porvir.
Fonte: Porvir.org | Luis Junqueira