O Prêmio São Paulo de Literatura deste ano trouxe gratas surpresas e não apenas em relação a escritores até então desconhecidos que foram agora “apresentados” ao público. Ao contrário dos anos anteriores, os premiados na categoria revelação são de editoras independentes. Com tiragem de apenas 500 exemplares, o livro “Antiterapias”, do mineiro Jacques Fux, editado pela belo-horizontina Scriptum, foi premiado entre autores revelações de até 40 anos de idade. A paulista Paula Fabrio, com “Desnorteio” (editora Patuá), foi agraciada como estreante acima de 40 anos, com a mesma tiragem. Para se ter uma ideia, o livro de Daniel Galera, “Barba Ensopada de Sangue”, vencedor na categoria melhor livro do ano (Companhia das Letras) teve tiragem inicial de 10 mil exemplares.
Caixeiro viajante do que é produzido em termos de literatura em Belo Horizonte, o editor da Scriptum, Welbert Belfort, conhecido por Betinho, defende que o trabalho deva circular ao máximo. Para que isso aconteça, ele frequenta os encontros de literatura com livros dos autores publicados por sua editora. “Aquilo que é feito tem que ser mostrado. Sempre encaminho meus livros para os jornalistas antes do lançamento e faço o acompanhamento depois”, explica Betinho.
Antes de chegar à Scriptum, “Antiterapias”, de Jacques Fux, foi recusado por algumas editoras, inclusive do Rio de Janeiro e de São Paulo. “O Jacques fez uma versão do livro em gráfica rápida e me entregou. Eu levei para ler num final de semana no sítio. Li, gostei e apresentei ao nosso conselho editorial. É um tema que me interessa”.
“Vejo se o livro cai no perfil da editora e encaminho para o conselho editorial. Eu tento não influenciar nenhum deles com opiniões sobre o que li de antemão. Eles têm completa autonomia. É um conselho ativo. Tentamos melhorar ao máximo o livro, resguardando criação do autor”, explica.
Jacques, portanto, encontrou na Editora Scriptum, uma possibilidade de coedição. “É de costume. Nós temos uma primeira tiragem entre 500 e mil exemplares. A editora não podia investir mais do que isso naquele momento, o Jacques tampouco. Então fizemos um acordo”, explica Betinho.
Antes de ser editora, a Scriptum já era livraria. São 17 anos vendendo livros e outros nove editando. Sobre o perfil de autores editados pela Scriptum, Betinho diz: “Primeiro, interessa aquilo que tem uma narrativa que vai trazer elementos surpreendentes na própria voz desse escritor, que seja peculiar. Isso não quer dizer que cair no lugar comum seja algo ruim, mas é porque já foi muito feito”, diz ele.
A Scriptum tem em seu histórico o lançamento de autores premiados na cena nacional. Antes de Jacques Fux, foram Carlos Britto, Ana Martins e Mário Alex Rosa. Os autores, por uma lógica de mercado, deixam a editora independente e têm seus livros lançados por editoras maiores. Ao ver os escritores migrarem para a concorrência, Betinho passa por sentimentos conflitantes. Primeiro diz: “Fico muito feliz porque nosso trabalho está sendo bem feito. São editoras que têm capital e os júris desses prêmios são muito conceituados”. Mas na sequência, alfineta as grandes editoras: “os conselhos editorais dessas editoras só buscam aqueles autores premiados, aqueles que já foram chancelados por algum júri. São editores de gabinete. Muitas vezes, buscam trabalho de autores que foram recusados por elas mesmas antes”, cutuca.
Orgulhoso por mais um autor premiado, Betinho conta: “O Jacques me falou: ‘vamos ver se agora o livro vende’”, diverte-se ele.
Fonte: O Tempo | Gustavo Rocha