
Explicar os sentimentos motivados pela maternidade não é tarefa fácil. Ser mãe é algo transformador e complexo, conforme constataram Juliana Ferreira de Paula (CRB-6/906ES) e Maria Aparecida Stelzer Lozorio (CRB-6/843ES). Ter nos braços um serzinho empacotado e com olhinhos curiosos mudou a visão das bibliotecárias sobre o mundo. Portanto, para entender um sentimento tão forte, o Conselho Regional de Biblioteconomia 6ª Região Minas Gerais e Espírito Santo (CRB-6) ouviu as duas profissionais. Confira.
Juliana Ferreira de Paula
Juliana descobriu em Felipe a razão para permanecer em um só lugar
Foto: Arquivo Pessoal
A então estudante de Biblioteconomia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) passava seus dias entre os livros e o lazer com as amigas e o namorado, até que em 2011 começou a sentir algo diferente em seu corpo. Era Felipe que estava a caminho. “Engravidei no final do curso, faltava cerca de um ano para eu me formar. Decidi trancar a graduação e comecei a trabalhar para cuidar do meu filho. Foi difícil no começo, mas no final deu tudo certo”, conta Juliana.
A bibliotecária retornou para o curso aos poucos, fazendo matérias isoladas aqui e ali até alcançar o diploma, em 2016. Nesse percurso, o namoro terminou, a mãe faleceu e muita coisa mudou, mas, o que permaneceu o mesmo foi o amor infinito pelo filho, a quem ela chama de “dádiva divina”. “Felipe é um amor. É difícil descrevê-lo porque a mãe sempre fica ao lado do filho, mas ele é um menino educado, simpático, extrovertido e sempre disposto a ajudar e a ensinar as pessoas”.
Empatia, ensino, suporte e simpatia são as características identificadas em Felipe e que também são parte da mãe, que as considera essenciais no trabalho que desenvolve na Biblioteca Pública Municipal Professor Mário José Jahel, na cidade do Fundão, no Espírito Santo, e nos cuidados com o filho. “Atualmente, sou responsável pelos processamentos técnicos, auxilio a Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo (SECULT-ES) a conseguir recursos da Lei Aldir Blanc para a biblioteca, pela produção de conteúdo para as redes sociais do espaço e também em projetos para as crianças, quando a biblioteca está aberta. Antes de colocar essas iniciativas em ação, as experiencio com o meu filho”.
Com a chegada da pandemia do novo coronavírus, Juliana precisou se afastar de alguns projetos profissionais. Por outro lado, a experiência de vida como mãe solo se tornou ainda mais presente. “Em questão familiar, esse momento está sendo ótimo para mim. Estou tendo mais tempo para ficar com meu filho, principalmente quando estou de home office, nós brincamos, fazemos receitas e jogamos vários jogos. Isso me fez lembrar de uma vez em que o Felipe me disse: ‘Mãe, meu sonho é você arrumar um emprego em casa para ficar comigo’, meus olhos encheram d’água. Ele tinha seis anos nessa época, agora com nove, esse desejo se realizou”.
O sonho de ter a mãe mais perto se tornou a realidade de Felipe bem antes da pandemia, segundo Juliana. A bibliotecária vivia mudando de cidade: morou no Rio de Janeiro, em Vitória, Cariacica, Serra e até em São Paulo. Ao perceber que os dois eram uma família feliz, Juliana entendeu que não precisava mais ir de um lugar para outro, criando raiz na cidade de Vitória.
Juliana na Biblioteca Pública Municipal Professor Mário José Jahel
Foto: Arquivo Pessoal
Maria Aparecida Stelzer Lozorio
Maria Aparecida encontrou na filha uma parceira de vida
Foto: Arquivo Pessoal
A união que começou no primeiro mês de gestação da bibliotecária, que atua como assistente de educação infantil, e da filha Maria Carolina se transformou em uma parceria de 20 anos – que, no próximo dia 8 de maio, véspera do Dia das Mães, vai completar 21 anos. Assim como grande parte das mulheres que nasceram nos anos 70, Stelzer, como é carinhosamente chamada pelos colegas de trabalho, acreditava que sendo mulher, o natural seria engravidar um dia, apesar de não ter esse desejo quando era mais nova. Maria Carolina chegou para o contentamento da mãe. “Se pudesse escolher, seria mãe dela de novo”, afirma a bibliotecária.
Stelzer foi casada por muitos anos até que a separação veio e a levou de volta à casa dos pais. No lar, a bibliotecária divide seu tempo entre o trabalho, os cuidados com o Alzheimer do pai e a placa na coluna da mãe, e o curso de História da UFES, no qual ingressou em 2017.
A vontade de conhecer mais sobre quem somos impulsionou a filha a ingressar na mesma graduação um ano depois.
“Quando ainda estudava Biblioteconomia, entre 2009 e 2013, levava a Maria Carolina para as aulas comigo a fim de que ela já começasse a entender que o ambiente acadêmico era para ela também. Estar na universidade, infelizmente, ainda é um privilégio. Além disso, como tomei gosto pela leitura durante os ensinos fundamental e médio, sempre incentivei a minha filha a ler e a buscar informações confiáveis”.
A quarentena imposta pelo cenário pandêmico colocou à prova a parceria entre mãe e filha. Em meio a isso, o trabalho único de restauração que desenvolve ao lado de duas primas, no Espírito Santo, a ensinou que “é possível reconstruir quase tudo”.
“Nós usamos o mesmo espaço para trabalhar e estudar. Às vezes, tenho que usar o escritório sozinha para atender ligações, porque meu pai não entende quando estamos ocupadas, ou temos apresentação de trabalho do curso no mesmo dia. Essas situações geram conflitos, mas no final tudo se resolve”.
Assim como Juliana, Stelzer considera a maternidade uma dádiva e complementa: “Depois de ser mãe, não compreendo como vivi tanto tempo sem minha filha. Ela é minha amiga, minha parceira. Quando se é mãe, você aprende a olhar mais para o outro”.
O trabalho de restauração
Ao lado das primas, Maria Aparecida é a única restauradora atuando no Espírito Santo. O primeiro contato com a técnica aconteceu na UFES em 2011. Naquele ano, as famílias participavam do núcleo de restauração da universidade em que a bibliotecária logo ingressou.
Uma das primas abriu um ateliê de restaurações e convidou Stelzer para participar como autônoma. Até então, a profissional participou de muitos projetos, como a reconstrução dos documentos históricos mais importantes do sudeste capixaba, os cartulários dos séculos XIX e XX da igreja, e o acervo da Biblioteca do Museu do Colono, em Santa Leopoldina, no Espírito Santo, que guardava até registros de casamentos de pessoas escravizadas.
O trabalho de restauração exige muito estudo e cuidado ao manusear os objetos
Foto: Arquivo Pessoal
O CRB-6 deseja a todas as mamães que o Brasil se torne um lugar seguro e próspero para que a maternidade possa ser exercida em sua plenitude. Ser mãe é um ato de bravura e de amor.