“O trabalho engrandece a alma”. A frase repetida centenas de vezes frente às trajetórias de Silvani Silva (CRB-6/720ES) e Victor Barroso (CRB-6/462ES) poderia ser completada com “quando feito com consciência social, ética e amor”. O Conselho Regional de Biblioteconomia 6ª Região Minas Gerais e Espírito Santo (CRB-6) ouviu os relatos desses bibliotecários sobre emprego, reinvenção e esperança.
Silvani Silva
Silvani Silva investe em ações para fortalecer o vínculo entre a biblioteca e o leitor
Créditos: Arquivo Pessoal
Antes mesmo da pandemia do novo coronavírus, a bibliotecária da Biblioteca Pública Municipal de Cariacica e do Centro Cultural Eliziário Rangel (CCER) via em si a necessidade constante de aprimorar habilidades para ser uma pessoa e profissional melhor. Com a chegada do fatídico março de 2020, Silvani teve a vida transformada como outros milhões de brasileiros e, para continuar tendo esperança, apostou no poder transformador dos livros.
“Na Biblioteca Municipal de Cariacica, buscamos em ações simples continuar o vínculo entre o espaço e o leitor. Investimos em uma nova forma de acolhimento, demos presentes e brindes a quem buscava a biblioteca para se cadastrar e até postamos fotos nas redes sociais das nossas instalações físicas. Às vezes, pensamos que a mudança só pode ser feita a partir de atitudes complexas, mas não é assim”; conta Silvani.
Biblioteca Municipal de Cariacica acolhe livros e pessoas
Créditos: Prefeitura Municipal de Cariacica
Desde 2018, a capixaba natural de Vitória vem alterando a realidade do município de Cariacica. Antes de ser convidada para fazer parte da equipe técnica da biblioteca da cidade, ela atuava em biblioteca escolar, experiência que a fez desenvolver habilidades essenciais para prestar um serviço melhor: empatia, escuta e capacidade de fazer muito com poucos recursos. “Minha primeira missão junto aos meus colegas foi trabalhar a parte organizacional do espaço. Implantamos o sistema de gerenciamento Biblivre por custar pouco, já que a falta de caixa é uma constante em grande parte das bibliotecas”.
Como ensinado nos cursos de Biblioteconomia, é impossível separar a profissão do social. Por isso, o trabalho da bibliotecária foi além da técnica: “Entendo a biblioteca pública como um espaço dinâmico. Em Cariacica damos suporte em outras áreas e ações. Por meio do contato direto, buscamos atender as necessidades dos nossos leitores. Assim, podemos descobrir como contribuir socialmente na realidade de cada um deles. Por exemplo, encaminhando algumas pessoas desempregadas para oportunidades de trabalho”.
A bibliotecária Silvani Silva: entre Serra e Cariacica
Créditos: Arquivo Pessoal
Apesar de trabalhar em Cariacica, Silvani mora em Serra, a cidade mais populosa do Espírito Santo. Foi andando pelo seu bairro que a bibliotecária esbarrou com o Centro Cultural Eliziário Rangel, fundado em 2016, a partir da vontade do psicólogo Antônio Vitor em combater preconceitos e desigualdades sociais por meio da cultura. Há cinco anos, Silvani atua na Biblioteca Carlos Peitos de Homem, localizada estrategicamente no primeiro andar do prédio. “Queríamos que o espaço acolhesse quem chegasse ao CCER”, afirma Antônio Vitor.
O psicólogo Antonio Vitor, fundador do Centro Cultural Elizário Rangel (CCER) e a bibliotecária, Silvani Silva
Créditos: Arquivo Pessoal
Os anos de luta por realidades mais justas ao lado de Silvani despertaram no psicólogo o sentimento de admiração pela bibliotecária e seus colegas de profissão. “O trabalho dela no Centro Cultural Eliziário Rangel é a consolidação das perspectivas ética e política da circulação da informação, do combate das verdades absolutas, ao fascismo. O bibliotecário é essencial, mas ainda muito desvalorizado, assim como as bibliotecas. O que temos que nos perguntar é a quem interessa a precarização de espaços e profissões ligadas à informação”, argumenta Antônio Vitor.
Antônio Vitor é o criador do Centro Cultural Eliziário Rangel (CCER)
Créditos: Arquivo Pessoal
A nova pandemia do novo coronavírus também afetou as atividades do CCER. Oficinas de teatro, capoeira, circo, balé, entre outras, agora são feitas on-line. Mesmo frente às incertezas, Silvani acredita nos efeitos positivos do trabalho do bibliotecário: “É um desafio, mas as bibliotecas e os espaços culturais devem atuar para amenizar este momento difícil pelo qual estamos passando. Temos que manter contato com os leitores, precisamos usar as redes sociais para enviar mensagens de acolhimento à população e indicar leituras que levem a uma nova visão de mundo. O livro nos dá essa possibilidade, não existem fronteiras geográficas no mundo dos livros. Por meio da leitura, somos capazes de nos projetar para o mundo imaginário”.
Biblioteca Carlos Peitos de Homem
O espaço do CCER foi batizado em homenagem a um dos líderes da Insurreição de Queimados, que aconteceu na cidade de Serra em 1849. O episódio histórico teve estopim quando negros escravizados exigiram a alforria com veemência, a ponto de ir à casa de alguns senhores. O momento teve outros líderes além de Carlos Peitos de Homem, que também nomeiam outros pavimentos do CCER.
Victor Barroso
Barroso acredita que a tecnologia é uma das formas de inovar as bibliotecas
Créditos: Arquivo Pessoal
Quando ingressou no curso de Biblioteconomia, o então aluno Victor Barroso só o fez para ter um diploma de Ensino Superior. Essa perspectiva mudou com o passar das aulas e ao perceber que o conhecimento que estava adquirindo poderia ser aplicado em diversas áreas. O que mais o encantou foi a possibilidade de lidar com a tecnologia direcionada às bibliotecas.
Portanto, em 2015, Barroso abriu a empresa @CERVOS, direcionada à informatização de acervos com o serviço de hospedagem de softwares para gestão. Nos últimos quase seis anos, o bibliotecário atuou para facilitar e aprimorar os serviços oferecidos pelas bibliotecas aos usuários.
“O primeiro passo do nosso trabalho é a colaboração com o cliente. Depois de conversarmos, identificamos as necessidades dos espaços e dos bibliotecários. A defasagem tecnológica, em grande parte, aparece nessa análise. Às vezes, a biblioteca não tem um sistema para atender os leitores nem suporte técnico”, explica.
Uma biblioteca com um sistema de acervo bem estruturado, com seções on-line e aberto ao público para marcação de atendimentos, verificação do catálogo de livros, leitura de e-books, entre outros, é uma forma de manter os usuários assíduos durante a pandemia do novo coronavírus porque facilita o caminho do público, segundo o bibliotecário.
Mesmo trabalhando com sistemas virtuais, Barroso enfrentou dificuldades profissionais trazidas pelo vírus, mas conseguiu se reinventar. “Com o fechamento das bibliotecas, parte delas pararam de investir em tecnologia, trabalhamos com assinaturas e muitas foram canceladas. Nesse cenário, decidimos investir na ampliação do catálogo de ferramentas de gerenciamento que oferecemos”.
Barroso apresenta o sistema de gerenciamento Biblivre a bibliotecários
Créditos: Arquivo Pessoal
Sempre focado em inovação, o bibliotecário aconselha aos colegas de profissão que perderam o emprego durante a pandemia: “A prestação de serviços na área de tecnologia é uma boa oportunidade para reinserção no mercado de trabalho. Embora os sistemas ainda não estejam tão presentes nas bibliotecas há outros espaços em que essa tecnologia é essencial, como o acervo de um escritório de advocacia”.
Parte do trabalho de Barroso consiste em orientar os bibliotecários e outros profissionais interessados sobre gerenciamento de acervos
Créditos: Arquivo Pessoal
Neste Dia Internacional do Trabalho, o CRB-6 destaca que vem desempenhando seu papel de fiscalizar o exercício da profissão, além de disseminar informações importantes para as bibliotecárias e bibliotecários capixabas e mineiros. Uma das nossas ações consiste na divulgação de oportunidades e qualificações profissionais semanalmente. Para conhecer o trabalho do Conselho, basta acessar as redes sociais: Facebook, Instagram, LinkedIn e YouTube, além do portal institucional.