Imagine o seguinte cenário. Uma empresa bem sólida é fortemente afetada pelo cenário econômico do país, os negócios parados literalmente, pessoas tiveram que ser despedidas, ajustes de áreas foram feitos. Esta mesma empresa desenha agora novas possibilidades, uma espécie de plano B ou C emergencial. Ela possui duas certezas. Primeira “a empresa não vai acabar” e segunda “a recuperação vai durar algum tempo”.
E neste cenário sombrio, a gestão toma uma decisão interessante – criar um ambiente amplo de compartilhamento de aprendizado. Mas você pode estar pensando, em plena crise parar para aprender? Para treinar? Com qual objetivo?
A resposta vem de uma terceira certeza “em certo momento a crise irá passar e teremos uma retomada”. Faz sentido, pois as pessoas que permaneceram e serão responsáveis por segurar as pontas durante o período nebuloso serão as mesmas que atuarão na retomada do crescimento.
Mas como fazer isto sem recursos e em um momento onde a palavra investimento foi banida do dicionário? Através do compartilhamento de conhecimento, ou como vem sendo chamado “aprendizado social”. Esta ideia não é nova entretanto as organizações que já usaram este conceito tiveram resultados surpreendentes.
Trata-se de algo simples mas que requer esforço e técnica para ser bem feito. Primeiro é necessário fazer um levantamento ou inventário dos conhecimentos e expertises já contidos dentro da organização. O que as pessoas conhecem bem, quais são suas experiências adquiridas, o que elas dominam com propriedade? Este levantamento deve ser alinhado, por outro lado, com as demandas de aprendizagem das mesmas pessoas.
Vou ilustrar. No fim dos anos 1990, Jack Welch visitava uma empresa em Londres e ao conversar com o seu mais alto executivo ouviu algo que lhe soou estranho. O CEO disse a Welch que estava recebendo ajuda de um mentor. Até aí nada de novo, a não ser pelo fato de que este mentor tinha a metade da idade do executivo. O tema central das conversas era uso e tendências de tecnologia no trabalho. Jack Welch comenta que esta foi a melhor ideia de gestão que ele ouviu nas últimas décadas. Ao voltar para o headquarter da GE, ele iniciou um processo ao qual chamou de Mentoria Reversa – onde seus mais de 500 alto executivos deveriam aprender com “mentores” mais novos. O próprio Welch teve um jovem para ensina-lo segredos das tecnologias na época.
O mais interessante deste conceito é que se utiliza o potencial já existente porém latente, ainda adormecido. Investimento? Praticamente zero. Mas cuidado. Não basta começar a criar duplas de mentores e aprendizes e iniciar as conversas. Conversas são apenas conversas quando não sedimentadas por uma estratégica que tenha claros objetivos e foco.
A famosa regra dos 70-20-10 deve ser aplicada aqui. As pessoas aprendem através de experiências (70%), ou por contato com outras pessoas (20%) sejam eles mentores, líderes ou coaches, ou por meios tradicionais como treinamentos formais (10%). Um bom programa de compartilhamento de conhecimento, ou aprendizado social, deve usar as três formas como mecanismos complementares.
Uma das grandes vantagens deste tipo de ação é que haverá uma interação enorme e não hierárquica entre as pessoas. Prepare-se para um grande desafio: o choque de gerações. Os “X” aprendendo com os “Y” e vice-versa. Por falar nisto, este programa não necessariamente precisa ser executado em pares, um a um. Os “Facebook corporativos” e ferramentas tecnológicas podem fazer com a mentoria e o compartilhamento de conhecimento abranja um número bem maior de pessoas produzindo resultados mais rápidos.
Imagine agora que a crise acabou. Qual organização você acha que vai alçar voo mais rapidamente. Esta que investiu tempo e foco em agregar conhecimentos, ou as milhares que apenas passaram os meses a reclamar?
Você decide.
Fonte: Exame | Renato Ricci