Admirador da paisagem urbana, professor de geografia cria página no Facebook com 400 registros de BH, que surpreendem e despertam curiosidade e, muitas vezes, emocionam quem os vê

Entre as imagens levantadas pelo professor de geografia Leandro Damasceno Coelho está a rua da Bahia na década de 1920 (Foto: Reprodução)
A história de Belo Horizonte passa pelos livros, mapas, documentos e, principalmente, pela memória de moradores que não se esquecem de imponentes prédios demolidos, da Avenida Afonso Pena, no Centro, arborizada com os fícus, dos bondes que saíram dos trilhos e outros fatos que fazem e marcam a vida da cidade. Agora, fotos de BH estão também nas redes sociais, exibindo imagens dos primórdios, desde os tempos ainda de Curral del-Rei, até a década de 1980, quando a capital já exibia crescimento vertiginoso e, claro, mazelas. Admirador da paisagem urbana, o professor de geografia Leandro Damasceno Coelho, de 29 anos, residente em Caeté, na região metropolitana, e docente em uma escola da capital, criou no Facebook a página Fotos antigas de Belo Horizonte, com 400 registros que surpreendem, despertam curiosidade e, muitas vezes, emocionam.
É nos momentos de folga, na sala de casa ou no quintal, debaixo da jabuticabeira, que Leandro gruda no computador e vai garimpando fotos em blogs, sites, arquivos de jornais e revistas e outras fontes. “Já tenho um total de 1,1 mil editadas, todas com crédito do autor e nome da publicação, prontas para pôr na rede”, diz o professor de geografia, que, para dar um diferencial, cria legendas para as fotografias. Algumas são do acervo do Estado de Minas e, numa delas, postou o Cine Metrópole, construído na década de 1940, no Centro de BH, com projeto do arquiteto italiano Raffaello Berti (1900-1972), e demolido em 1983, para dar lugar ao prédio de um banco. “Era uma construção bonita, foi também teatro municipal”, diz Leandro, admirando as linhas do Metrópole, que, na época do clique, exibia o filme Tess, dirigido por Roman Polanski. Impressionado com o cinema de rua, o professor escreveu na legenda: “Vejam como está lotado! Para quem não conheceu, ele se localizava na esquina das ruas da Bahia e Goiás”.
Sem fins comerciais, o serviço prestado por Leandro é feito para divulgar episódios e flagrantes da capital mineira. “Penso que estou unindo cultura e utilidade pública”, afirma o professor de ensino médio da Escola Estadual Deputado Ilacir Pereira Lima, no Bairro Cachoeirinha, na Região Nordeste. “Morei seis anos em BH e sempre prestei muita atenção nos prédios, nas ruas e praças. Gosto muito da cidade. Na consulta das fotos –85% em preto e branco –, vejo como a cidade mudou, casarões foram substituídos, numa transformação permanente”, afirma o jovem, que iniciou a página em agosto do ano passado. A visita ao espaço virtual ganha a cada dia 30 novos internautas, havendo, até hoje, mais de 15 mil acessos, com consultas de moradores de Portugal, Estados Unidos, França e Itália. “Como se trata de uma página de fotos antigas, o interesse é muito específico”, observa.
A preferência do professor recai sobre retratos dos primeiros tempos, como um de 1895, que mostra a primitiva Igreja da Boa Viagem, onde foi construída depois a catedral homônima. O comentário de que BH está em permanente mutação não deixa de surgir, já que a Arquidiocese de Belo Horizonte acabou de iniciar as obras da nova sede episcopal, a futura Catedral Cristo Rei, na Região Norte. Outra foto, de 1969, que desperta grande interesse do professor, mostra a antiga Boate Ponteio, na saída para o Rio de Janeiro, sumida do mapa, estando hoje no lugar um shopping. “Não me canso de olhar essa paisagem. Não existia ainda a Avenida Raja Gabaglia, era tudo bem diferente, lá no fundo não há casas nem prédios”, afirma. Outro registro mostra a região da Pampulha antes de ganhar o conjunto arquitetônico que saiu da prancheta de Oscar Niemeyer (1907-2012).
Tranquila
No dia a dia, Leandro publica duas fotos e vai substituindo aquelas que estão há mais tempo na rede. “O bom disso é que ela dá mais amplitude às fotos, fica mais fácil de olhar. As pessoas adicionam os amigos e cada um tem contato com o material”, afirma o professor, que põe o laptop ao colo e viaja no tempo. Muitas vezes, ele se espanta com as mudanças da cidade: “Pelas fotografias, posso ver uma cidade tranquila, sem essa confusão do trânsito. Havia o trem Vera Cruz para o Rio de Janeiro (RJ); tenho várias fotos dele. Certamente era uma viagem ótima até a capital fluminense”, imagina o jovem professor, que já foi até Vitória (ES) de trem.
Embora seja professor de geografia, Leandro conta que sempre gostou de história e, antes de se dedicar à página, escrevia artigos para um jornal de Caeté. Na mesa da cozinha, estão alguns exemplares e ele se orgulha dos textos. Depois, com agilidade, volta ao notebook e mostra um registro da Rua da Bahia, na década de 1930, com o famoso Bar do Ponto na esquina da Afonso Pena. Os arcos do Viaduto Santa Tereza, com poucos carros circulando, também fazem os olhos do professor brilharem. Mas uma cidade não é só feita de ângulos bonitos, prédios charmosos e praças arborizadas. No seu arquivo, Leandro mostra também os efeitos das enchentes de 1979, que fizeram subir as águas do Ribeirão Arrudas e do Córrego do Vilarinho, na Região de Venda Nova. Na triste cena, um grupo de moradores se esforça e se equilibra para atravessar a via pública, que, como a própria foto mostra, virou um rio caudaloso.
Fonte: Estado de Minas | Gustavo Werneck