Donos de canais populares no site tentam entender impacto da novidade na receita
Dono do 11º canal mais popular em número de inscritos do YouTube no Brasil, o Desce a Letra, Cauê Moura tem dúvidas sobre o futuro do YouTube. O motivo é o lançamento do YouTube Red, a versão paga do site de vídeos do Google, que se tornou realidade na última semana após anos de especulação. Em meio ao alvoroço do evento, os produtores de conteúdo do site, conhecidos como youtubers, ainda buscam entender quais as perspectivas de seus canais. “Se o YouTube Red vingar e gerar muitas assinaturas, levando um monte de gente a assistir aos vídeos sem anúncios, como fica o repasse de dinheiro para nós?”, pergunta Moura.
A dúvida de Moura é a mesma de diversos youtubers brasileiros e, pelo menos por um tempo, ela deve continuar sem resposta. Como não há previsão para o YouTube Red chegar ao País, ainda há poucas dicas sobre como o serviço vai funcionar. Ao colocar a nova versão do site no ar nos EUA na última semana o Google informou apenas que “vai dividir os ganhos das assinaturas com os criadores de conteúdo”. Procurado pelo Estado, o Google não comentou a situação.
O YouTube Red foi lançado como uma opção sem anúncios ao site tradicional. Para assistir aos vídeos, porém, o usuário precisa pagar uma mensalidade de US$ 9,99 (cerca de R$ 38).
O valor dá acesso a todos os vídeos disponíveis no YouTube tradicional, mesmo sem conexão de internet, além de conteúdos exclusivos como filmes e séries desenvolvidos pelos youtubers mais populares em parceria com o Google. É o caso de PewDiePie, dono do canal mais popular do mundo, que já anunciou uma série na plataforma, Scare PewDiePie, na qual viverá situações assustadoras dos games na vida real.
Se para os assinantes as vantagens ficaram claras, para os youtubers o cenário ainda é nebuloso. Atualmente, os donos dos canais não sabem exatamente quanto vão ganhar, já que o faturamento depende, em partes, da audiência do vídeo. Atualmente, o valor é previsível, já que, a cada mil visualizações, os canais recebem um valor determinado pelo Google – ele considera as impressões dos anúncios na página do canal, bem como publicidade exibida no início dos vídeos.
A outra parte do faturamento dos canais provém de publicidade direta, uma estratégia cada vez mais frequente entre os youtubers mais populares.
Com o YouTube Red, a lógica deve mudar. A sensação de incerteza ficou ainda maior depois que o YouTube confirmou que os produtores que não aceitarem ser parte do Red terão seus canais “escondidos” entre os milhões de vídeos da plataforma.
A estratégia é uma forma de “obrigar” os canais mais populares a aderirem à novidade, fator determinante para atrair assinantes para o Red. “É difícil dizer o que vai acontecer com a gente após o Red”, diz Lucas Rangel, que fez fama no Vine, mas migrou para o YouTube em 2014.
Para os canais menos populares, a situação pode ser mais dramática. Os menores temem perder audiência, já que os assinantes do Red poderão assistir aos seus vídeos sem passar pelos anúncios. É o caso de Tiago Belotti, do canal Meus 2 Centavos, que acaba de chegar aos 55 mil inscritos. “Nem sei se o YouTube sabe que o meu canal existe, então não vou receber uma proposta do Red tão cedo”, diz o youtuber.
O Porta dos Fundos, maior canal da plataforma no Brasil com 10,7 milhões de inscritos, vê com otimismo o lançamento do YouTube sem anúncios. Com audiência bem estabelecida e mais de 50 funcionários, a empresa defende que a mudança ajudará canais menores a crescer. “Surgimos no YouTube, mas só conseguimos crescer fora. A plataforma não deixou isso acontecer”, diz Ian SBF, diretor do Porta.
A chegada do Red pode iniciar uma corrida entre os canais menores para crescer a audiência rapidamente e chamar a atenção do Google. Ao receber um convite para criar conteúdo exclusivo no Red, a receita poderia aumentar. “Canais menores, com 50 ou 100 mil inscritos, vão tentar pular para o outro lado”, diz Luis Bonilauri, diretor da consultoria Accenture para a América Latina.
Tudo de graça
O YouTube Red é a mais nova tentativa do Google de ganhar dinheiro com o site de vídeos. Em 2013, a empresa criou alguns canais exclusivos com conteúdo pago, mas a estratégia não deu certo. Uma das principais razões é a “cultura do grátis”: vale a pena pagar por vídeos que sempre estiveram disponíveis de graça? “O legal do YouTube é que era tudo para todos. Agora, a lógica financeira vai monetizar tudo. Isso é chato”, diz Belotti, do Meus 2 Centavos.
Com o modelo de assinatura, o YouTube se torna uma plataforma de vídeos mais parecida com o Netflix, que já surgiu como um serviço pago. Atualmente, os brasileiros que assinam o serviço precisam pagar uma mensalidade a partir de R$ 19,90. “Pode levar um tempo para que o Google ensine aos usuários que a internet também precisa ser paga. O Netflix não teve essa dificuldade. Nunca tirou doce da boca de ninguém”, diz Ian. Para Leon Oliveira, do canal Coisa de Nerd, as pessoas vão avaliar se vale a pena pagar US$ 9,99 para não ver um anúncio de cinco segundos. “O conteúdo original vai ter que ser tão bom quanto o do Netflix para dar certo.”
Apontado como principal rival do Red, o Netflix foi um dos primeiros a apostar em uma estratégia de conteúdo próprio, com séries de TV e filmes exclusivos. Atualmente, o serviço possui 69 milhões de assinantes em todo o mundo e a empresa espera alcançar 74 milhões de pessoas até o final de 2015.
Fonte: Estadão | Matheus Mans