A Bibliotecária-Documentalista da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), doutora e mestra em Ciência da Informação, também pela UFMG, defendeu a tese “Aspectos Simbólicos da Prática da Leitura Literária em Contextos de Adversidade”, no último dia 10.
Ela explicou que o interesse pela temática da leitura literária começou com uma inegável afeição pessoal pela literatura, resultando em inquietações e questionamentos dos leitores de obras literárias e suas intrínsecas relações com os livros. O interesse resultou em uma dissertação de mestrado sobre leitura e seu compartilhamento em plataformas digitais, seguindo o percurso da leitura que atinge o íntimo e se expande para o coletivo.
“A experiência de pesquisar o compartilhamento da leitura literária, durante o mestrado, possibilitou o ingresso no mundo de vida dos leitores de literatura, revelando emoções intensas nos depoimentos. Já, no doutorado, a pesquisa explorou ainda mais a temática, norteada pela leitura que se expande, não mais extrapolando o sujeito e influenciando os demais pelo compartilhamento, mas, sim, a leitura aprofundada na mente, se enraizando no consciente e no inconsciente do leitor. A leitura de obras literárias é uma experiência que desperta uma diversidade de sensações, sentimentos, pensamentos e reflexões entre os leitores. A tese explicita a potência da leitura para lidar com sentimentos e vivências desafiadoras, como as doenças, traumas, lutos, perdas emocionais, depressão e demais situações adversas”, avalia Jéssica.
O processo para uma pesquisa de doutorado envolve muita dedicação, esforço e comprometimento. É um trabalho árduo e gratificante. “Tive a oportunidade de conhecer e analisar leitores maravilhosos e suas experiências de leitura em meio a situações pessoais muito desafiadoras. É admirável ver a leitura se tornar estratégia de enfrentamento, resistência e resiliência na vida dessas pessoas”, observa.
Jéssica conta que, durante o estudo, fez muitas descobertas, pois a análise demonstrou que a leitura não é simples distração, mero prazer despretensioso, mas, uma experiência afetiva, social e existencial, proporcionadora de autonomia, elucidando vivências singulares, promovendo a atividade psíquica e elaborando emoções e pensamentos. A relação afetiva dos leitores com a literatura ficou evidente em seus depoimentos, demonstrando a conexão do ser humano com a arte da narração, um vínculo profundo, uma necessidade.
O estudo identificou que não existe uma tipologia específica de obra a ser indicada para o enfrentamento das adversidades e que os leitores trabalharam com o que tinham à mão, entre clássicos, romances de banca, best-sellers, literatura nacional e estrangeira, poesia e prosa. “A situação parece indicar que não há regra para impulsionar a capacidade de reconstrução do leitor com a leitura literária. O essencial, talvez, seja uma disposição, uma abertura pessoal para o processo ocorrer e uma ligação especial com a literatura, uma compreensão subjetiva de sua aptidão criativa, construtiva, fruitiva”, revela.
Uma das conclusões foi identificar o protagonismo dos leitores na criação de estratégias de enfrentamento das adversidades (conscientes ou não), recorrendo à prática da leitura literária para encontrar, ainda que de modo não necessariamente intencional, o fortalecimento emocional, acolhimento, escape, reconstrução psíquica, elaboração de traumas, compreensão de si mesmos e do mundo.
O próximo objetivo da Bibliotecária é publicar artigos sobre a tese para contribuir com a comunicação científica sobre a temática da leitura literária nos campos da biblioteconomia e Ciência da Informação. “Prosseguirei com minha atuação como Bibliotecária-Documentalista na UFMG, um grande sonho que tive a oportunidade de realizar neste ano”, afirma.
Como tudo começou
A pesquisadora revela que a biblioteconomia não foi sua primeira opção. A área surgiu como uma oportunidade de colaborar com a construção do conhecimento. “Sim, eu escolhi o curso por sonhar com um local de trabalho, no caso, a biblioteca, que possibilitasse o acesso das pessoas aos diversos tipos de documentos, para que cada um tivesse a chance de ampliar seu conhecimento. Uma visão um tanto romântica, confesso, olhando para a realidade de nossas bibliotecas – em especial, as públicas que sofrem com o descaso do governo, tendo acervo e estrutura precários. O ideal é democrático, não é utópico, mas possível, embora não dependa somente da boa vontade dos profissionais da informação. Contudo, a biblioteconomia me trouxe algo mais. Algo que nunca imaginei e, que por muito tempo, achei que não era capaz: me apaixonar pela pesquisa. Me encontrei assim: Bibliotecária e pesquisadora”.